domingo, 20 de abril de 2008

O telefone

Volta e meia paro pra refletir sobre uma antiga questão que angustia a alma feminina desde a segunda metade do século XIX, quando Alexander Graham Bell inventou certo aparelho que viria a facilitar imensamente a comunicação entre as pessoas. Se não vai ligar, pra que diabos pega o número do telefone? Durante uma dessas reflexões recordei-me de um caso que me aconteceu há vários anos e que aqui relato para vocês.

Estava eu um chorinho com algumas amigas em plena segunda-feira, quando adentra o recinto um amigo de uma delas que estava com um amigo. Amigo do amigo da amiga este que ficou atraído pelos meus incontáveis encantos, e eu pelos dele. Em pouco tempo, já havíamos esquecido o mundo à nossa volta e num canto do bar, nos intervalos entre um beijo e outro, conversávamos sobre as nossas vidas. E assim foi passando a noite. Quando os músicos já tinham parado de tocar e já tínhamos todos os quadradinhos da fileira de cerveja riscados em nossas cartelas de consumo, nos vimos obrigados a ir embora. Foi nesse momento, que a pessoa pela qual eu passaria os próximos 365 dias da minha vida perdidamente apaixonada pediu meu telefone. Eu, trôpega, devido à quantidade exagerada de álcool no cérebro e em todo o resto do corpo, dei um número de celular.

Quando cheguei em casa, estava comendo alguma coisa na cozinha, afinal não se vive só de lúpulo e cevada, e meu irmão mais novo acordou.

- Qual o número do meu celular? – perguntei para o rapazinho que bebia um copo de água ao meu lado.

Ele articulou a seqüência de algarismos que fazia soar meu aparelho. Nesse momento me desesperei. Eu tinha bebido tantas cervejas que tinha errado o número do meu próprio telefone! Não acreditava naquilo, tinha conhecido o meu muso inspirador e por minha culpa, ele jamais poderia me ligar e me chamar pra sair!

No dia seguinte, amargando aquela ressaca, fui encontrar meus amigos na praia (bons tempos aqueles...). O muso também estava lá e fui tratando rapidamente de fornecer-lhe a combinação correta de números com a qual ele poderia me localizar.

Mal sabia eu que ele não pretendia fazer uso do aparelho de Bell.

Passamos um ano nos relacionando ocasionalmente. Freqüentávamos o mesmo ponto da orla carioca e os mesmo bares, aos quais eu ia assiduamente, na esperança de encontrá-lo e cair em seus braços. Algumas vezes eu conseguia atingir o meu objetivo, muitas outras não.

Já no final desse ano, em determinada sexta-feira, eu estava em casa decidindo se levantava da cama para ir a uma festa ou continuava dormindo. Pois é, aquela peregrinação diária pelos bares estava me cansando, aliás, nem sei como sobrevivi a essa época, em que a boemia estava totalmente arraigada ao meu ser. Estava inclinada a me entregar a Morfeu, a festa era longe, eu ia ter que dirigir até lá, e a tarefa de perseguir o muso já estava se tornando enfadonha. Aí o telefone tocou.

- Samanthinha, sou eu, o muso! Você vai à festa?
- Vou, claro!
- Você me dá uma carona?

Levantei da cama imediatamente, feliz da vida para me arrumar para a tal festa. Afinal, depois de meses de encontros fortuitos, finalmente o muso tinha me ligado e me chamado pra sair. Foi assim que, apaixonada, enxerguei aquela ligação.

Mas naquela mesma noite eu ia acabar caindo na real. É triste encarar os fatos, mas a única vez que ele me ligou foi para pedir uma carona!

Samantha J.

sábado, 19 de abril de 2008

Botando pra jogo

Galinhagem, nenhuma vontade de assumir relacionamentos sérios... Besteira! O principal defeito dos homens da minha geração é a total falta de sutileza. Não sou exatamente uma virgem puritana, mas em determinadas ocasiões, o linguajar "peão de obra", definitivamente, afasta qualquer possibilidade de aproximação.Vejam a sensacional cantada da qual fui vítima certa vez.

Toda mulher tem um fã. Um daqueles apaixonados incansáveis, que continuam babando por nós mesmo depois de uma sucessão de passa-foras e desculpas esfarrapadas para recusar convites. E como eu não sou exceção, carrego uma cruz dessas em minha vidinha. Por sorte, essas pragas são como um vírus incubado. Se manifestam de vez em quando para depois amargarem um longo período de inércia. Enfim... são uma praga cíclica. E para meu infortúnio, a minha praga reapareceu dia desses. E em grande estilo!!Foi uma manifestação telefônica, menos grave do que uma visitinha surpresa, mas ainda muito desagradável. Principalmente quando acontece às 11h da noite de uma sexta-feira em que você não está pra noitadas e já está, inclusive, paramentada com aquela roupinha mulambenta que só usa para dormir desacompanhada. E se eu não estava preparada para emoções naquela noite, imaginem para ouvir a seguinte proposta:

-E aí? Tô no bar...! Vem pra cá agora! (assim mesmo, sem dar nem boa noite, com voz de bêbado)
-Não dá, tô dura
-Quem falou em dinheiro?
-Tô com sono
-Nisso 'a gente' dá um jeito (assim mesmo, na terceira pessoa, igual a jogador de futebol)

Eu, já sentindo que as desculpas esfarrapas de sempre não iam colar, mandei logo um incisivo "não rola"! Piorei a situação! Ao invés de demover o indivíduo da idéia, encorajei o figura. Porque só mesmo um cidadão com muita coragem- e cara de pau- para fazer uma proposta dessas pra uma mulher:

-Maisa, vamos falar diretamente. Você tá namorando?

Medo! Respirei fundo e respondi:
-Não exatamente... mas estou com meus pensamentos ocupados, se é que me entende...
-Não interessa! (elevando o tom de voz). Quero saber se é oficial, namoro mermo!
-Não, disse eu, pra lá de reticente.

Foi a deixa. Era informação suficiente pra ele fazer a indecorosa e inacreditável proposta:

-Ah! Então pára de frescura e vamo botá isso aí pra jogo!

Acreditem! O gentil rapaz me propôs "botar isso aí pra jogo"! (seja lá o que "isso" signifique literalmente, mas que só pode ser o que eu e vocês estamos pensando).

É a reprodução fiel do que ouvi. Não fiz qualquer adaptação para fazer graça. Será que o sujeito já obtivera êxito com outra moça utilizando a tal proposta? Ou será que o moçoilo me enquadra na categoria de mulheres encalhadas-carentes que se sentem lisongeadas com qualquer cantada por puro e simples desespero?

Esse episódio lamentável só me leva a concluir que tenho dedo podre até quando não o aponto para ninguém!

Maisa K.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

O Vegetariano

O moçoilo, à primeira vista, parecia um príncipe! Mas não resistiu a um olhar mais atento e se revelou um sapo mais cedo do que eu esperava. Pra dizer a verdade, acho que a culpa foi até minha, porque eu tenho uma tendência a ser, digamos, otimista demais. Vejo que o cidadão é mala ou pela saco e dou crédito assim mesmo, por achar que o ser humano sempre é passível de salvação. Tolinha, eu! Quase 30 na cara e ainda não aprendi... Bem, vamos ao causo.

O personagem em questão, como sabem, parecia um príncipe. Era inteligente (embora gostasse de Diogo Mainardi), gentil, e esteticamente interessante. Por isso ignorei os primeiros sinais de potencial pela-saquice como o fato de o bonitão não beber (nada, nem aquele golinho do brinde), não comer carne e não gostar de samba. Enfim... Ninguém é perfeito, pensei eu. O problema, porém, é que com o passar do tempo fui constatando que não era só a carne bovina que o meu príncipe dispensava. Tenho motivos fortes para afirmar: o rapaz também não me parece muito chegado à carne humana. E entre estes indícios, um dado estatístico inquestionável: nos quatro meses em que durou o romance, só tivemos um, digamos assim, momento de intimidade uma única vez! Isso mesmo. Umazinha só! Falta de oportunidade, devem estar pensando alguns leitores. Você dificultava pro rapaz, imaginarão outros. Mas está longe disso. Eu sou uma moça decidida e sem pudores para tomar iniciativas. E foi com essa falta de pudores e a cabeça povoada de pensamentos pecaminosos que eu escolhi um vestidinho azul com um decote sugestivo para sair com ele num sábado.

Lua cheia no céu, a família viajando e a casa só pra mim... Tudo propício, né? Seria, se o bonitão não tivesse feito o favor de colocar todos os meus planos por água abaixo. E ao contrário do que diz aquele ditado racista, o cidadão não fez a merda só na saída não. Já estreou bem, me pegando às 6h da noite (???) e me levando para um romântico... RODÍZIO DE MASSAS!!!! Pulta quil pariu! Nada contra massas (minha silhueta um tanto generosa, aliás, deve-se em parte a elas). Mas vocês hão de convir que se empanturrar de canelone não é muito aconselhável antes de certas atividades, se é que me entendem. Além disso, que clima romântico resiste a um lugar barulhento, cheio de crianças brincando de esconde-esconde sob as mesas, sob a trilha sonora de "parabéns pra você", cantados em versões engraçadinhas a cada cinco minutos naquelas mesas de aniversariantes lotadas?

Pois é... Mas quando eu estou in love, quase nada me abala. Abstraí tudo e, é claro, comi pra cacete. Mas nem o fato de ter ficado com a barriga cheia a ponto de mal conseguir respirar impediu que eu fosse embora dali cheia de amor pra dar...Porém, a recíproca não era verdadeira. Leitores, creiam: o bonitão foi me deixar em casa (onde eu estava sozinha, vale lembrar) às 11h da noite e se despediu no carro mesmo. Nem os meus nada discretos convites para uma subidinha o seduziram. Disse que tinha que acordar cedo para meditar ou algo assim, num tal grupo filosófico lá, do qual ele era adepto. E o pior: não era desculpa esfarrapada, uma vez que o moçoilo me ligou quando chegou em casa e engatou uma conversa de meia hora! Ou seja: não foi comer outra! Olha... eu acho até que se fosse esse o caso, eu perdoaria. Mas me deixar lá, toda solícita, pra ir se concentrar para uma meditação ou algo parecido é demais, né não? Será que meu vestido azul não agradou??

Maisa K.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Aconteceu com uma amiga!

Após a cópula, o casal está esparramado na cama do motel. O ambiente é como na maioria dos motéis razoavelmente bons, propício ao intenso interesse sexual entre as partes. Meia luz, algumas latinhas vazias de cerveja, filmes pornográficos passando na televisão, um colchão confortável, banheira de hidromassagem e aquela pista de dança esdrúxula que ninguém nunca entendeu por que estava ali (se quisessem dançar tinham ido a uma boate, e não ao motel).

Os espelhos no teto e nas paredes refletem os dois corpos lânguidos e bem esculpidos por muitas horas nas suas respectivas academias de ginástica.

A moça é muito bem apanhada e tem uma retaguarda de respeito. Enquanto faz cafuné no jovem com músculos bem definidos deitado ao seu lado, ouve a seguinte frase:

- Aê, gata! Tô olhando a gente no espelho e tô me ligando numa parada, a minha bunda é bem mais sarada que a sua.

Samantha J.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Domingo...

Um domingo como muitos outros. Com um churrasco, cerveja nem sempre muito gelada, amigos e música. Acontece que algo raro se operava no meu ser: nesse fatídico dia de descanso, eu não quis beber. E como é uma tarefa enfadonha agüentar bêbados sem ser um deles... Deixei meu querido namorado à época em meio aos amigos e me retirei.

Tudo teria ocorrido muito normalmente, se eu não tivesse deixado de notar uma pessoa estranha em meio aos muitos amigos, uma rapariga de índole duvidosa (note que o termo rapariga aqui é usado no significado nordestino da palavra, e não no lusitano). Como meretriz que se preza gosta de homens comprometidos e canalhas, esta em questão farejou o meu ex-namorado. Enquanto eu dava uma dormidinha na casa dele a pouquíssimos metros do evento, o cretino embriagava-se e deixava-se enredar pelos encantos da moça, nem tão moça e nem um pouco encantadora, diga-se de passagem.

Como depois de passar algumas horas nos braços de Morfeu já tinha visto um longa metragem inteiro e nada do digníssimo voltar para casa, liguei para o seu celular.

- Cadê você, meu amor?
- Zaqui a pouco estou aí, só vamos tomarrrr uma saideira na esssssquina.

Como eu também sou um pouquinho boêmia, entendi.

Segundos depois tocava a campainha. Era a dona do churrasco, que passava para deixar os CDs que o calhorda tinha levado para colaborar com a trilha sonora. Pois como boa parte dos músicos, além de ser um calhorda tem um bom acervo musical.

- Nós estamos indo para o bar da esquina, você não quer vir?
- Não. Eu não estou a fim de beber hoje.
- Você tem certeza? Se eu fosse você vinha!

Ela bem que tentou me avisar, mas eu ainda não tinha me dado conta da conjuntura que estava formada: o meu namorado estava quase se atracando com umazinha na frente de vários amigos e no bar que visitávamos com uma freqüência maior (bem maior) que a indicada pelos médicos, enquanto eu esperava por ele amavelmente. Como o tempo continuava passando e nada dele chegar, liguei mais uma vez:

- Cadê você???
- Estamossssss indo pra o Capela.
- Poraaaaaaaaaaa! Eu estou aqui há horas te esperando. Você está indo com quem?
- Com o XXX (nome do amigo) e a mulherrrrrrrr que ele está pegando.

Foi nesse momento que tudo ficou claro! O que eu não queria enxergar desde o início da tarde agora estava ampliado diante dos meus olhos, na verdade ouvidos. Enquanto ele dizia que só tinha uma mulher no carro eu ouvi duas vozes femininas dialogando!
Diante disso, juntei meus trapos, coloquei na mochila e parti decidida a fazer duas coisas: ir até lá dar na cara dele e nunca mais voltar àquela casa. Infelizmente, naquele dia só cumpri a primeira das resoluções.

Chegando ao Nova Capela, reduto da boemia carioca, parei meu carro na calçada e fui abordada por um bêbado que estava por ali e quis aproveitar pra ganhar us trocados guardando o único carro que estava estacionando. Isso mesmo, aos domingos de madrugada até a Lapa pode ser um lugar calmo.
Louca de fúria abri a porta do recinto e imediatamente avistei os dois casais numa mesa no fundo do bar. Não pude controlar o meu impulso agressivo. Arremessei ali da porta mesmo, a minha bolsa (muito bonita, por sinal) contra o tórax do canalha. Quando cheguei perto da mesa, aos berros, o quarteto e todo o resto dos presentes me olhavam atônitos. Gritei ordenando que o cidadão levantasse e viesse ter uma conversinha amigável comigo ali fora.

Quando saí e olhei para trás percebi que o homem tinha virado um rato e se acovardado perante a cólera de uma singela mulher de um metro e meio. Simplesmente não tinha obedecido à minha ordem. Como com uma mulher furiosa e um pouquinho mandona não se brinca...
Voltei até a porta, e enquanto todos os espectadores ainda estavam digerindo, junto com seus cabritos (carro chefe do cardápio do Capela) o escândalo que eu havia feito poucos segundos antes, eu gritei dali para quem quisesse ouvir:

- Você não vai ao menos ser macho de vir aqui fora falar comigo?

Como não havia remédio, pois eu havia acabado de colocar em cheque a sua masculinidade, fazendo um esforço sobre-humano para não tropeçar nas próprias pernas, o bêbado adúltero levantou. Já do lado de fora, depois de levar umas duas ou três (quatro, será?) tapas muito bem dadas e muito merecidas, ele tentava explicar o inexplicável.
Jurava que só tinham três pessoas no carro e que a rapariga (que tinha vindo do mesmo lugar que o resto do grupo infame e não tinha carro) não tinha ido com eles. Aí eu pude imaginar a cena: uma piranha loira e baranga negando uma carona entre bairros para se exercitar um pouco num domingo de madrugada no intervalo entre um chope e outro.

- Encontro com vocês lá! – teria dito ela!

No entanto, apesar de sempre escolher homens errados, eu juro que sou uma mulher inteligente. E essas desculpas esfarrapadas só vieram a aumentar meu ódio.

- Entra no carro agora XXX (o nome do indivíduo). Você vai embora comigo agora!!!

Como eu já dei a entender algumas linhas acima, coragem nunca foi uma grande qualidade do rapaz. Eu bradava vários impropérios enquanto mandava que ele entrasse no automóvel.
Foi aí que o inesperado aconteceu.
O bêbado, que se propusera a guardar o carro em troca de alguns vinténs para comprar mais uma cachaça, não se conteve e intrometeu-se:

- Ô XXX (o nome do tal), entra no carro, cara. Se eu fosse você, entrava...

Quando eu finalmente consegui sair dali, até dei algum trocado para aquele sábio ébrio. Ele mereceu!

Samantha J.